Fonte: Bia Labate
Por Clara Novaes
Após a publicação na França do livro “Plantas psicotrópicas. Iniciações, terapias e buscas de si“, organizado por Sébastien Baud e Christian Ghasarien em setembro 2010, pela editora Imago, neste mês de março os autores puderam encontrar-se durante dois dias, 23 e 24 de março de 2011, na Universidade de Strasburgo dando lugar a um vivo debate em torno das principais questões problematizadas no livro.
Ora, como é sabido, as interrogações sobre a consciência e seus estados são uma constante na história da humanidade. Essas interrogações muitas vezes implicaram a busca de estados de consciência diferentes dos estados ditos “ordinários”. Entre os meios empregados para tal artimanha encontram-se os vegetais psicoativos cuja utilização tem despertado cada vez maior interesse em meios ocidentais.
Acompanhando esta evolução, nos dias atuais vários pesquisadores, em diversas culturas e sociedades, refletem sobre as motivações e modalidades de indução voluntária dos estados alterados de consciência por meio de substâncias psicoativas. No livro, encontraremos algumas dessas reflexões em torno da ayahuasca, coca, kambô, peiote, cacto de San Pedro e tabaco.
Foi igualmente nessa perspectiva que nessa “jornada de estudos” em Strasburgo os autores abordaram as dimensões iniciáticas, terapêuticas, espirituais e identitárias em curso nessas práticas. Os usos dessas substâncias foram interrogados tanto nas sociedades nas quais existe uma representação coletiva para tais usos rituais, inscrita no registro do simbólico, como no quadro das reapropriações ocidentais cujo uso faz alusão a um movimento de “desenvolvimento pessoal” e “trabalho espiritual” ou simplesmente uma busca de novas experiências.
Assim, segundo o fio das intervenções abaixo, foi possível abrir um dialogo e um pensamento em torno dessas questões e do lugar que elas ocupam no contemporâneo, altamente marcado pelo cruzamento de práticas e suas mestiçagens.
Na quarta feira, 23 de março, o evento foi aberto com a projeção de um documentário de 2010 feito por Nadège Chabloz, pesquisadora do Iboga, intitulado: “Bwiti e Iboga em VF: itinerário de um iniciado militante”. A autora estava presente e uma discussão com o público pôde ocorrer. O filme conta o processo iniciático de uma pessoa sobre a qual ela escreveu seu artigo.
Na quinta feira, 24 de março, a jornada foi densa, contando com seis intervenções além da apresentação inaugural feita por Sébastien Baud. Bernard Weniger abriu a discussão matinal, fazendo uma exposição geral sobre os “Usos tradicionais de substâncias psicotrópicas e enteógenas na América tropical”. Em seguida o professor de antropologia da Universidade que sediou o evento, Eric Navet, também autor do livro, introduziu o mundo dos cogumelos psicoativos com sua fala “As vias da amanita-muscaria: entre “inferno” e “paraíso”. A palavra foi dada em seguida a Arnaud Van de Casteele que fez uma apresentação “aperitivo” da bebida absinto a partir do seu artigo e pesquisa “A mise en scène do absinto”.
No começo da tarde, foi a vez da doutora em antropologia Beatriz Labate introduzir questões legais, judiciais e políticas relativas à ayahuasca: “Ayahuasca e o processo de regulamentação no Brasil e no estrangeiro: implicações e desafios”. Sua fala permitiu um debate mais vivo de pontos cruciais que tocam os usos dessas substâncias e suas diferenças ou semelhanças legais em diversos países do mundo.
A antropóloga francesa Rama Leclerc assegurou a sequência, expondo seu trabalho “Curandeiros shipibo (Amazônia peruana) e ayahuasqueiros ocidentais”. Finalmente, coube a Christian Ghasarian situar práticas que ele qualifica de neoxamânicas de cunho New Age com a apresentação do seu trabalho “Introspecções neoxamânicas através do San Pedro”.
No fim do dia, foi possível discutir com os autores que juntos puderam levantar certos pontos, ressituar certos aspectos dessas práticas, expor certas posições políticas, acadêmicas e responder às questões do publico, que foi numeroso nesse encontro.
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