quinta-feira, 16 de junho de 2011

Tipologia da Viagem: cartografias da psiconautica

Fonte: Hempadão - Portas da Percepção

O psiquiatra checo Stanislav Grof foi um dos pioneiros no estudo da psicoterapia com LSD e é considerado por grandes autoridades na área como “mestre teórico” do “movimento”. Grof procurou usar psicodélicos como catalisadores de estados não ordinários de consciência, visando a superação de conflitos psicodinâmicos e o contato com realidades invulgares, entre elas, muitas das quais eram procuradas e experienciadas por antigos iogues, xamãs e místicos. Sendo assim, Grof desafiou o padrão de pensamento típico do ocidente, falando cientificamente e fenomenologicamente de meditação, identificação com o cosmo, transcendência, vidas passadas, experiências fora do corpo, premonição, fenômenos paranormais, etc., associando sua nova visão com os avanços da física de partículas e com o paradigma holográfico (e suas variantes).

Se não podemos falar de uma realidade última ou da totalidade do cosmos a partir de um único modelo de ciência, conforme os estudos de Grof, Jung, etc., nos mostram, então qual são nossas possibilidades para falarmos dos estados alternativos de consciência? Para Grof, é necessário falar dos mapas, da cartografia da alma, buscando ao máximo a proximidade com a totalidade (holos), isto é, levando em conta as infinitas interconexões entre ser e mundo. A tipologia da trip com psiquedélicos se configura, de acordo com Grof, em 4 distintos tipos de experiências (diferenciação didática), sendo descritas como:
 
 
- Estéticas ou Abstratas
- Psicodinâmicas, biográficas, rememorativas
- Perinatais
- Transpessoais
 
 
As experiências estéticas são muito comuns, e levam o psiconauta a alterações da sensação e/ou percepção. De acordo com Grof, em “Além do cérebro”, “Nada percebi neste nível de estados psicodélicos que resistisse a uma interpretação numa linguagem estritamente newtoniana-cartesiana”. Em outros momentos, considera a experiência estética de pouca valia, o que nos leva a pensar em certo preconceito do psiquiatra em relação ao que Carl Gustav Jung (1875-1961) chamou de “função sensação”, que seria uma das funções através da quais percebemos e organizamos o mundo interno e externo. A função sensação se caracterizaria, como diz o suíço, em suas palestras de Tavistock, de 1935, por responder a pergunta: “O que é”, sendo uma função a-racional, tendo finalidade identificatória. Ao desconsiderar a lógica das sensações, Grof permanece preso também a determinada limitação conceitual. Consideramos que o vislumbre de outros modos de sentir, ver ou perceber, podem levar o psiconauta a outros territórios ou fluxos que dificilmente poderiam ser experimentados sem os psiquedélicos.
 
 
As experiências que ele denomina como psicodinâmicas, são relativas à resolução ou ao ato de reviver conflitos psicológicos relevantes, deste modo, mostrando o fabuloso potencial dos psiquedélicos para a prática psicoterapêutica. Quem já passou por essa experiência, sabe com que facilidade os enteógenos nos colocam cara-a-cara com os conflitos mais importantes de nossa vida num determinado momento, conflitos os quais muitas vezes não queremos ver, ouvir, resolver ou pensar sobre. Este nível da experiência foi muito valorizado, p.ex, por Albert Hoffman ao considerar as potencialidades do LSD nos estudos e terapias psicológicas.
 
 
No que se refere às experiências perinatais, às quais, confesso, não estou habituado, por não ter uma ampla vivência deste nível, pode-se dizer que foram observadas por Grof a partir da prática clínica, assim como teoricamente influenciadas pela visão pós-psicanalítica de Otto Rank. Ele concedeu grande importância na estruturação da personalidade aos traumas do nascimento. Grof acreditava que o nível perinatal, desconsiderado pela maioria das psicologias, era um nível de relação entre as experiências pessoais e as transpessoais, onde haveria grande mistura entre padrões arquetípicos e fenômenos bio-físicos. Ela está ligada intimamente a nascimento e de que forma este se deu, mas também está relacionada a como lidamos com padrões de “morte-nascimento”, padrões intimamente ligados a ritos de passagem.
 
 
Finalmente, o nível transpessoal seria caracterizado por fenômenos que normalmente patologizamos, isto é, consideramos como “doentios” ou simplesmente loucos. Neste nível podemos incluir contato com espíritos, entidades, paranormalidade, sensação de fusão com o cosmos, com outras pessoas, telepatia, vidas passadas, dentre outros. Embora a ciência ocidental tenha descartado estes fenômenos como doenças, inverdades ou simplesmente os ignorado, sendo incapaz de explicá-los, a filosofia oriental teve uma visão ampla e satisfatória de muitos deles, saber que influenciou sobremaneira pensadores como Stanislav Grof, Timothy Leary, Alan Watts, Aldous Huxley, Richard Wilhelm, etc.
 
 
Pergunto aos leitores: em quais níveis de experiências vocês já surfaram? Em algum deles conseguiram observar um desenvolvimento duradouro em suas próprias personalidades?

0 comentários:

Postar um comentário